Substância está a um voto de ser descriminalizada pelo STF
Autor: Leo Moreira
Decisão do STF sobre descriminalização da maconha deve sair até o fim de novembro - Foto: Raphael Muller / Ag. A TARDE Data: 26/11/2022
A descriminalização das drogas é um tema sempre sensível, polêmico e que divide opiniões. Em agosto deste ano, o assunto voltou aos holofotes, após a então presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Rosa Weber, manifestar seu voto a favor da descriminalização do consumo recreativo da cannabis Sativa. No entanto, a seção foi interrompida depois que o ministro André Mendonça pediu vista. Agora, com o prazo de 90 dias, ele tem até o final de novembro para decidir se quer ou não descriminalizar o uso recreativo da "verdinha". Hoje, o placar está 5 a 1 para que o porte de maconha para uso pessoal não seja mais considerado crime. Mas o que deve mudar caso o uso da substância deixe de ser crime?
Atualmente, consumir a maconha é crime, porém, sem uma pena de prisão, o que pode causar uma certa confusão, como explica a Presidente da Comissão Especial de Ciências Criminais da Ordem dos Advogados do Brasil - Seção Bahia (OAB-BA), Fernanda Ravazzano.
"O artigo 28 da Lei das Drogas (Lei 11.343/2006) não prevê, para o uso drogas, pena de prisão mas uma pena alternativa". O magistrado pode determinar que o sujeito frequente cursos para saber os males que as drogas provocam, entre outras penas similares, aponta Ravazzano. "O grande problema é que ao mesmo tempo que o artigo 28, que não prevê pena de prisão, o artigo 33 da lei de drogas prevê a pena de prisão para tráfico de drogas e pelo uso também da droga. A diferença é que um é para uso exclusivo e o outro é que pode compartilhar com terceiros, vender, manter em depósito, cultivar, semear, etc", explica a advogada.
Ela também conta que o imbróglio começou por volta de 2006, quando a prática deixou de ter pena de prisão. Na ocasião, a discussão seria "se seria ou não descriminalizado" o uso de drogas. Porém, "na época, o STF decidiu que houve foi uma despenalização e não uma descriminalização".
Para advogada, STF contribuiu para o imbróglio jurídico sobre liberação das drogas| Foto: Rafaela Araújo/ Ag. A TARDE Data: 11/08/2023
"O entendimento do supremo não foi o mais acertado. Porque se você não prevê uma punição natural do direito penal que é a privação de liberdade, então, o que teria acontecido mesmo seria uma descriminalização", continua.
Para o diretor-executivo da Iniciativa Negra por uma Nova Política sobre Drogas, Dudu Ribeiro, "a atual política de drogas do Brasil tem produzido mais danos do que soluções".
"[A lei] não tem protegido a saúde pública. Pelo contrário, ela tem fortalecido as organizações criminais, a ocupação dos territórios de forma violenta e o favorecimento, sobretudo, do altíssimo encarceramento da população negra", explica.
Ribeiro, que também é especialista em segurança pública, acredita que "o STF perdeu uma oportunidade quando deixou de fazer o debate original que era sobre a declaração de inconstitucionalidade do artigo 28 da Lei de Drogas. Isso era em uma perspectiva de descriminalização do uso de substâncias psicoativas e o supremo resolveu reduzir o debate apenas a maconha".
Segundo ele, "a descriminalização é necessária para desmontar a guerra das drogas. Ela em nada significa a liberação do uso das substâncias. O que a gente mais pauta, na verdade, é a regulação pelo Estado do acesso às substâncias psicoativas. Que não seja regulado pelo tráfico, porque ele é regulado pela violência", salienta.
Segundo Dudu Ribeiro, "a atual política de drogas do Brasil tem produzido mais danos do que soluções"| Foto: Rafaela Araújo/ Ag. A TARDE Data: 11/08/2023
Ribeiro não acredita em uma "radical mudança no primeiro momento", caso os ministros decidam por descriminalizar o uso da maconha, mas que "abre um campo de possibilidades para continuar, inclusive, o debate sobre uma lei de drogas mais justa no Brasil.
Impacto da descriminalização da maconha
Além do tema da descriminalização do uso da maconha, a diferenciação do usuário do traficante com base na quantidade de droga encontrada também está em pauta no Supremo.
Ao contrário do primeiro tema, o STF já tem maioria (6 a 0) para definir que pessoas flagradas com pequenas porções de maconha não devem ser tratadas como traficantes. Mas, o que seria essa pequena quantidade? Enquanto o ministro Cristiano Zanin defende que a quantidade de posse de uma pessoa para ser considerada usuária seja de 25 gramas, Alexandre de Moraes quer que o limite seja de 60. Já o ministro Luís Roberto Barroso defendeu em um primeiro momento 25 gramas, mas aumentou para 100 gramas. O que pode causar um grande impacto no sistema carcerário do Brasil.
Segundo o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), caso o limite proposto por Barroso e por Moraes seja aceito, 31% dos processos por tráfico em que houve apreensão de maconha poderiam ser reclassificados como porte pessoal. 27% dos condenados poderiam ter os julgamentos revistos por estarem dentro do parâmetro.
A própria Rosa Weber, na ocasião, chegou a afirmar que pelo menos 7.769 processos em instâncias inferiores da Justiça estão suspensos até que a definição seja tomada.
"Primeiro que para o processo de desencarceramento das pessoas presas justamente pela lei de drogas, vai precisar de um esforço também do judiciário para acelerar os processos para a gente conseguir reduzir, inclusive, um dos graves crises que nós temos, que é a superpopulação carcerária. Inclusive, o próprio Supremo Tribunal Federal já declarou um estado de coisas inconstitucional no sistema prisional brasileiro", diz Dudu Ribeiro.
Ele acredita que isso dê espaço para um debate mais amplo. "O que a gente vai precisar também é aproveitar isso para fazer um debate mais complexo sobre o sistema prisional brasileiro, porque ele não tem favorecido, na verdade, a proteção das pessoas, a responsabilização das pessoas, e já tem sido uma forma de fortalecer as organizações criminosas".
Votos dos Ministros
Sobre os dois temas, seis dos 11 ministros já votaram: Gilmar Mendes (relator), Luís Roberto Barroso, Edson Fachin, Alexandre de Moraes, Cristiano Zanin (contra a descriminalização da maconha, mas a favor de diferenciar usuário de traficante) e Rosa Weber.
Faltam: André Mendonça, Nunes Marques, Cármen Lúcia, Dias Toffoli e Luiz Fux.
Com os votos, os placares estão da seguinte forma:
-> Descriminalização do porte para consumo pessoal - 5 a 1
-> Diferenciação do usuário para traficante - 6 - 0
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